segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Não adianta, a gente se fecha.

Compartilhamos anos juntos, nos acostumamos com a mania, o jeitinho, o gesto do outro, com o cheiro - ah, o cheiro -, mas depois que termina a gente se fecha. E depois de tudo isso não queremos repetir. E por não querer repetir, a gente se mete numa redoma, meio infantil, capengando, falando aqui e ali que o amor é uma droga. Aí a gente cai. Chega aquela outra pessoa, intro ou extro, feinha ou bonita, mas que estende a mão, se liberta, se entrega e se diz preparada... mas achamos que é mais difícil "o amor da gente", que nosso romance de antes é mais forte que qualquer outro romance. A gente sempre acha que em nosso naufrágio tem mais vítimas.

Mas não.

Aí a gente quer ser indiferente, aí "tanto faz se ela quer ligar, tanto faz se a carta vem ou não". E aí caímos mais ainda. E não caímos no fundo no poço. Na verdade tropeçamos num labirinto. Não num labirinto de sebes; num labirinto cinza e cheio de edifícios, com o vai e vem da rotina, o cheiro do esgoto e do cigarro, o rosto anônimo - ou uma máscara? - e muitos tropeços. Tropeçamos na queda do próximo e vamos nos guiando, fugazes, respirando a angústia alheia. Aí o labirinto não acaba nunca.

E a gente enxerga que
Com a ignorância
Vem o alívio.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

É estranho.

Eu não consigo me calar quando o coração se pronuncia. Às vezes desejo que ele simplesmente bata. Às vezes nem isso. E quando falo, quando dou voz ao coração e razão à sinceridade, vomito incessantemente devaneios e alguns apetites. E essa voz, que julgo ser claríssima e universal ao juízo de todos às vezes soa como um ruído contínuo e quase inaudível. Fico feliz quando a situação é essa: do coração resmungando vontades numa sala vazia de corações. E em alguns casos, quando eles [co]existem, a indiferença está enraizada e o coração já virou escravo do orgulho e refém da frieza. E o pulso pulsa com repulsa. E aí eu abro a porta e procuro outra sala. Mas sempre procuro salas, nunca fujo pela janela nem fico inerte, me adaptando à apatheia. Eu odeio a apatheia.

E quando a gente encontra um coração que dá ouvidos ao nosso mas mesmo assim se mantém distante, a gente fica perdido. E às vezes esse norte nós nunca encontramos, pois desaprendemos a usar nossa bússola. O coração alheio não se permite nem se liberta. Ele fica ali, ouvindo os batimentos e inflando o próprio Chagas. Às vezes rindo. Ele-não-se-entrega-e-não-cria-devaneios-e-não-pensa-nos-afagos-nem-nas-pernas-entrelaçadas-tão-pouco-no-cheiro-da-pele-nos-lençóis. Ele existe. Inerte. Querendo. Ou nem quer, apenas está. Pisando na rosa dos ventos, calado e sabendo o seu rumo. E a gente se vira com uma bússola estragada. A gente morre um pouquinho nesse intervalo que as paixões recém se descobrem.

E no meio disso tudo, tentamos limpar as incertezas com um pano rasgado. Tentamos pintar na tela a nossa arte mas não temos nem a tinta. Tentamos escrever, mas as palavras não suportam o peso do coração.